sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Crítica de "Brooklyn"

Histórias de imigrantes em Nova York são constantemente aproveitadas por Hollywood. Vide o clássico segundo filme da trilogia "O Poderoso Chefão" que trata exatamente sobre esse tema. Porém, lá, o interesse era em demonstrar os italianos e principalmente a Cosa Nostra. Em 2015, o diretor irlandês John Crowley busca prover uma apresentação pessoal sobre esse fenômeno migratório, adaptando o romance de Colm Tóibín em um filme não-comercial. A história acompanha Eilis (Saoirse Ronan), uma irlandesa frustrada com a sua vida na terra natal e que busca na "América" uma melhora em seu estilo de vida, tanto profissional quanto pessoal. Lá, a jovem mora em uma pensão no Brooklyn (local que era comum a chegada de imigrantes irlandeses), onde viva uma intensa paixão que pode mudar sua vida. O longa recebeu 3 indicações ao Oscar (filme, roteiro adaptado e atriz principal), além de ter sido premiado no Festival de Sundance. Trata-se de um retrato bem diferente da situação do imigrante nos EUA. Através do olhar intimista do diretor, o longa consegue atravessar os diferentes momentos da vida de alguém que saiu de casa: o estranhamento inicial aliado com a saudade, a descoberta de novas realidades e pessoas e o começo da relação empática com o novo espaço. Através de uma direção bastante detalhista, alternando entre planos fechados para mostrar solidão e abertos para mostrar uma espécie de aconchego, Crowley utiliza bastante do cenário a seu favor. Mas, mesmo assim, os atores são extremamente bem dirigidos e a cena é muito bem composta visualmente. Aliás, o diretor provê metáforas visuais belíssimas que dialogam com a proposta do filme, através do uso de cores diferentes e opções de fotografia.

Fotografia essa que se assemelha muito com a do filme "Carol", mas aqui está mais bem realizada. Afinal, desde a primeira cena, a paleta usada no filme já remete a um tempo passado. Aliados a isso, estão a maquiagem e o figurino que estão perfeitamente condizentes com a época em que a narrativa se passa. Tudo isso é fruto de um design de produção minimalista que, mesmo sem exagerar, consegue prover um visual bastante limpo e agradável. Agradável. Talvez essa seja a palavra-chave do filme. O roteiro adaptado por Nick Hornby ("Livre") consegue apresentar um ritmo perfeito que nunca é rápido demais como "A Grande Aposta" nem lento como "O Regresso". Ele consegue oscilar bem entre os momentos dramáticos, felizes, de descoberta, etc. O drama do filme é extremamente bem construído, visto que é muito humano. E não, um drama ser humano, não é um pleonasmo vicioso. Muitos filmes americanos tem a mania de exagerar nos momentos dramáticos para promover uma catarse no final. Isso funciona muito bem em algumas obras, realmente, mas cria-se uma espécie de distanciamento entre o público e a história que prejudica a narrativa. "Brooklyn" não segue por esse lado e, apesar de apresentar bons contornos dramáticos, estes são extremamente bem escritos e principalmente interpretados.

Saoirse Ronan é a grande surpresa do elenco. Americana, filha de pais irlandeses, a atriz promove uma identificação grandiosa com o espectador. Sua atuação apresenta carisma, além de enorme capacidade de inspirar os sentimentos nas horas certeiras. É visível como cada olhar da atriz tem um significado especial e como ela consegue demonstrar suas emoções, muitas vezes, sem precisar de palavras. Outro destaque do elenco é Domhnall Gleeson que tem se mostrado um ator extremamente versátil e que tem escolhido excelentes trabalhos. Basta lembrar que em 2015 (além do filme em questão) o ator teve seu papel em "Star Wars: O Despertar da Força", "Ex-Machina: Instinto Artificial", além do também oscarizado "O Regresso". Aqui Gleeson não possui um papel muito grandioso, mas é essencial para o conflito final da protagonista, inspirando um sentimento necessário à narrativa. Um ponto fraco do elenco, porém, é Emory Cohen, que faz o par romântico principal. O ator não inspira veracidade alguma, além de apresentar uma dicção fraca que tira um pouco o charme da história.

A trilha sonora é um pouco decepcionante. Não pela qualidade, mas pela ausência nos momentos cruciais. Ora, o filme começa com uma melodia extremamente suave e doce, porém ela é praticamente esquecida durante o filme todo. Falta um tema recorrente que ajude a dar esse tom agradável tão comentado. A montagem é excelente, assim como a edição. É visível como a mensagem passada é completa e toda cena tem seu valor. Além disso, os cortes são bastante naturais e o diretor sabe fazer bom uso das tomadas. É visível o baixo orçamento do longa, mas mesmo assim Crowley consegue utilizar artifícios interessantes para enquadramento e movimentação de câmera. Muitas vezes, em uma cena, o foco é capaz de pegar mais de um plano. É algo muito difícil de se fazer, principalmente pela confusão visual que pode causar. Mas, aqui, é realizado com extrema delicadeza e consegue passar o contraste visual de iluminação desejado. Longe do que Tarantino fez em "Os Oito Odiados", mas funcional. "Brooklyn" é um filme extremamente charmoso que, através de design de produção fantástico e ritmo agradável, consegue prover uma interessante visão da vida de uma imigrante, sob os olhos de um competente diretor irlandês.

Nota: 


- Demolidor

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